sábado, 7 de novembro de 2009

EU SOU GENTE

                                       Foto: Por do sol porteirense presenteada por Anaí Tavares

Não quero me misturar ao lixo de modo indiferenciado.
Sou gente que come, que chora, que brinca, que cata.
Pobre de carne e osso.
Que sonha, que se deita na cama com o corpo que dói.
Que beija o filho.
Que enxerga a pobreza dos ricos.
Que separa o lixo de modo ecologicamente correto.
Que corre ao encontro do caminhão público na rampa.
Política do resto, do descarte, do fedor.
Sou gente que deita com meu homem mesmo faminta.
Que coloca em dia a força das entranhas, no gozo.
A mesma entranha que pariu os meus pequenos.
Sou gente que detesta pesquisa sem ação.
Que luta por algo que nos tire do atoleiro da fome.
Sou gente de favela, mas também sou do universo.
Deste imenso território mal distribuído.
Sou gente quase sem domicílio.
Sou gente, sou mulher, próxima de muitos não...
Não isso, não aquilo, não aquilo lá.
Construtora de um sim, muito lento.
Eu sou gente. Apareço nos dados do IBGE.
Eu sou Maria, sou Joana, sou Raimundinha... sou eleitora.
Eu sou catadora de lixo, sou recicladora.
Sou líder comunitária.
Eu sinto o mau cheiro de tudo.
Daquilo que se deixou de fazer pelo faminto.
Inclusive daquilo que desce pelo ralo.

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